segunda-feira, 22 de junho de 2015

Desintoxicando a vida



Esta última semana ponderava terminar minha conta no Facebook. De algum tempo para cá, os posts agressivos tornaram-se cada vez mais frequentes e isso causa-me um tremendo mal-estar, especialmente porque tenho como amigos em rede social pessoas que me são caras.

Não curto a forma agressiva de explanação do Malafaia – apesar de, em linhas gerais, concordar com o teor – e sinceramente acho que muitos nem prestam atenção ao que ele diz, justamente pela forma colérica como fala. Já pensam em contra-atacar. Curto ainda menos os contra-ataques. Foi altamente deselegante um jornalista do porte do Boechat abrir a boca na rádio e dizer “para falar em bom português, vá procurar uma rola” ao pastor Silas Malafaia. Primeiro, isso não é português, isso é ofensa. E que ninguém me venha com a historinha de que "rola é passarinho" ou que "ele que começou". Poupem os meus neurônios. Português é o lindo idioma que eu falo. Pessoas ofenderem-se umas às outras em palanques, púlpitos, rádios, midias sociais, tem outro nome: agressão verbal. Não curto, não repasso, não acho legal. Deveríamos estar acima disso.
Entretanto, foi aniversário da minha filha e vi as fotos da celebração. É verdade que se eu deletar a conta, ela acaba por me mandar algumas fotos por whatsapp. Mas decidi que não é o comportamento de outrem que há de determinar a forma como eu levo a minha vida. Portanto, vou apenas excluir os que repassam posts e comentários que me incomodam. Não deixo de amar ninguém e não deixo de ser amiga, mas não concordo. Quero a minha página elegante. Quero a minha página da paz. Sou cristã. Desde os 22 anos convertida após uma pregação do próprio Malafaia. Mas sempre frequentei a igreja Batista porque meu temperamento é outro. E respeito toda e qualquer religião. Até quem não tem nenhuma. E respeitar é saber que a pessoa tem o direito de professar a sua fé, e não tem direito nenhum de ridicularizar a minha nem de me colocar no mesmo balaio de maçãs envenenadas. Se alguém me der doce de Cosme e Damião eu vou comer – hoje não, porque preciso manter a dieta. Acredito que meu Deus é maior do que essas bestices pequenas. Mas morrerei respeitando o meu irmão de fé que não toca num saquinho. Eu não disputo santidade com o meu irmão, até porque sei que vou perder a disputa no primeiro round.

Eu tenho um montão de amigos homossexuais e outro montão heterossexuais. Tenho certeza de que todos eles são pecadores. Coincidência, eu também sou. Então, porque ficar com essa coisa desgastante de isso é gay, aquilo não é gay, vamos governar para os gays, orgulho hetero, orgulho gay?
Eu passo a minha vida tirando bocadinhos de sangue para saber se ele vai ou não prestar para os próximos 6 meses. E terei que fazer isso para o resto da minha vida, seja ela mais curta ou mais comprida. Isso me incomoda, mas não tanto quanto ver meus amigos falando de vinganças, propagando o fim do Cristianismo, apoiando intolerância religiosa, isso sim, me consome. Isso é mais tóxico do que os 30 comprimidos por dia ou do que o saquinho de líquido amarelo descendo pela veia. 
É hora de desintoxicar.

Verónica Vidal

quarta-feira, 17 de junho de 2015

♫ Caminhando e cantando ♪

Aventura em imagens

Ter visitas em casa é a coisa mais chata do planeta. Eu não tenho o menor talento para fazer sala, para servir coisinhas. Por isso eu opto por receber amigos. Amigo tem que aprender de imediato onde ficam os copos e onde é o caminho da geladeira. Amigo precisa saber logo como se abre a janela do banheiro e onde fica o Gleid, porque nessa vida humana, nenhum de nós bebe perfume.  

Ter uma família como a minha é uma bênção sem tamanho. Porque todos são deliciosamente aconchegantes, maravilhosamente barulhentos e completamente diferentes uns dos outros. 

Minha tia Denise - a eterna miss - trouxe seu marido e todo o seu frescor para a minha casa. Senti-me como que roubando o tempo dos dois, como a criança que ganha um brinquedo no Natal e quer brincar com ele de dia e de noite, e acaba por capotar por falta de energia mas nunca por falta de vontade. 

E eles haviam feito um desvio em sua viagem de férias pela Europa, só para me visitar. E eles ainda ficaram mais uns poucos dias, só para me agradar. E cantaram e tocaram violão. E fizeram show de música brasileira numa casa de fados de Coimbra. 

Nessa visita descobrimos que um Mário português tem parantesco próximo com um Ademar baiano. Em algum lugar na história o DNA destes maridos se misturaram de forma tal, que um ficou como o outro e o outro como o um. Mais ou menos assim. É bem verdade que Mário não toca violão tão bem como o Ademar, mas reconheço que eu destruo com maestria toda e qualquer música que começar a cantar. Nós os quatro fazemos dois casais perfeitos. Musicalmente falando, também.

Eu acho que, quando perdemos nossa mãe, catamos migalhas de amor de mãe aqui e ali. E reconhecemo-lo mal ele desponta. Porque é só quando se ama muito uma pessoa e se  tem a liberdade de dizer: "Não pinte seu quadro de amarelo. Você será mais feliz se pintá-lo de vermelho. Eu já pintei quadros, e é melhor o vermelho, vai por mim." E diz-se porque o desejo que o outro seja feliz é maior do que o desejo de ser aprovado. Quem ama, não liga se o outro vai ficar amuado. Ele diz: "Não sobe na árvore, que você cai."
E então senti-me amada. Ainda que a minha tia seja muito mais jovem do que a minha mãe seria, senti aquele calor de conselho de mãe, que é coisa impossível de descrever. 

E por cá ando eu, juntando as minhas tintas vermelhas. Porque descobri que esperto é aquele que aprende com os sábios.

Ao Ademar, sábio homem que roubou o coração da tia Denise.
À minha tia miss, que sempre foi linda mas é mesmo estonteante por dentro.

Verónica Vidal

quinta-feira, 4 de junho de 2015

Uma vida com muita vida

Estaríamos hoje todas juntas na casa da mamãe, a celebrar seus 73 anos. E ela, com seus imensos olhos cor de mel, inevitavelmente choraria. 

Quantas e quantas vezes vem-me à cabeça um pensamento recorrente: "vou contar à minha mãe", para imediatamente depois eu sacudir esse pensamento da ideia porque a lembrança de que minha mãe já não está aqui estala como um flash. Sinto um misto de idiotice e tristeza num segundo, para logo então voltar aos meus afazeres cotidianos e bestinhas.

Nunca consegui me lembrar a data da morte dos meus pais. Na minha cabeça, seus epitáfios têm somente as datas de nascimento. Ambos são de 1942. Ambos morreram eu tinha pouco mais de 30 anos. Entretanto, as datas de aniversário, aniversário de casamento, essas sim, eu nunca esqueci. Há de ser a seletiva memória que tenho, que só escolhe os bons momentos para guardar. 

Uma das provas mais duras que uma pessoa pode passar na vida é ficar sem mãe. Em qualquer idade, perder a mãe é perder o chão, perder o colo, a segurança do aconchego. É ter que viver sozinho, ainda que se esteja rodeado de irmãos, marido, mulher, filhos. Temos então que, finalmente, crescer. Porque não é somente a mãe que enxerga o seu filho como uma criança. O filho, enquanto tem mãe, será sempre meio criança, simplesmente porque pode ser. E essa obrigação de crescer de repente dói.

Nunca consegui, e sei que jamais conseguirei ser melhor mãe para as minhas filhas do que a minha foi para mim. D. Lina nasceu com o dom divino da maternidade. Tomava tabuada, botava de castigo, dava chinelada e enchia de carinho. Cresci vendo a minha casa sempre com muitas crianças. Minhas irmãs, minha tia menina Licinha, Cláudia e Adriana que eram as filhas da vizinha, minha prima Monique, a Gracinha, filha da tia Miloca, e um pouco mais tarde, meus primos Daniela e Leonardo. E iam por variados motivos. Para passar um fim de semana, um bocadinho das férias, para a mãe ir à faculdade, ou só porque sim. Mamãe sempre ficava feliz com aquela meninada toda. Não foi diferente quando nasceram as minhas filhas. Sei que a vovó Lina, apesar de ter partido cedo, será para sempre a referência de avó para elas. Porque algumas pessoas, vivem muitos anos, mas na verdade vivem pouco. Minha mãe, viveu poucos anos, mas viveu muito. Viveu nos sonhos que teve, no amor que derramou, nos livros que leu, na intensidade de cada gesto.

Mamãe, feliz aniversário! (até breve)

Verónica Vidal