terça-feira, 24 de setembro de 2013

Insensatez

E é porque me inspiras e é porque me seduzes e é porque me excitas e é porque me encantas. E é porque passa o tempo, e havias de fazer algo de péssimo, a fim de quebrar o encantamento, mas não o fazes, e sigo assim, enfeitiçada, perdida, atordoada.

E é porque me socorres e é porque me curas e é porque me escutas. E num diálogo não verbal diz-se tudo e mais ainda. Em palavras diz-se tudo aquilo que não se queria dizer. É melhor ser muda. Mas nada muda.

E quando te fazes frágil e julgas desencantar-me, fazes-te menino e te fazes mais humano, menos herói, mais real, mais perto. Mais doce. E a insensata dependência que me ata a ti tira-me o conforto, descontrola-me, mete-me medo. Desejo a insanidade mental declarada a fim de viver declaradamente o desejo insano. Quero todas as coisas, da forma mais egoísta possível, e talvez, apenas talvez, consiga.

Verónica Vidal - triste daqueles que não vivem paixões insensatas, loucos amores, daqueles inexplicáveis. Durem o quanto durem, são essenciais.

sábado, 14 de setembro de 2013

Meia-idade em crise

 
E quando a dúvida bate à porta, a insegurança esbraveja e não há quem nos ouça, empurrando-nos para um lago mudo de tristeza? Seriam estes alguns dos sintomas da crise existencial que nos assola na meia idade?
 
Seria esta sensação de impotência diante de um futuro que antes vislumbrávamos sereno, como prémio por uma dura vida de plantio, mas que se apresenta ácido e estreito devido à pilhagem que o sistema impiedosamente tem feito aos nossos celeiros, o sentimento de desesperança que nos tornará seniores?
 
Talvez a tal crise da meia-idade ataque mais comumente a homens que a mulheres. Nossos meninos passam então a se sentir emasculados, uma vez que o governo é o primeiro a lhes capar a virilidade financeira enquanto nós exibimos a nossa independência conquistada à custa de queima de sutiãs. Quando é que o fosso entre as Amélias e as Pagus da vida será eliminado? Ainda teremos por quanto tempo guerras sexistas veladas dentro de casa, que fazem com que releguemos os nossos companheiros à categoria de competidores inimigos e eles nos enxerguem como usurpadoras da sua preciosa masculinidade?
 
Ganhamos hoje companheiros - maridos, namorados, amantes - que tendem a lutar contra um sem fim de cobranças, numa idade que já deveriam supostamente ter encontrado o equilíbrio financeiro e emocional. Às portas de mudarem de categoria no escalão da vida, quando deixarão então de serem adultos produtivos para se tornarem velhos ociosos, o medo lhes invade a alma, pois percebem que tudo o que haviam sonhado, planejado e construído desfaz-se como um castelo de cartas. E é nessa hora que o nosso título de companheira deveria lhes valer. Mas não. Enterramo-nos nas nossas conversas fiadas de filhos e netos e cores de vernizes e lipgloss, orgulhamo-nos em pagar o batom com o nosso próprio salário e chamamos a isso independência. Mas ainda assim, queremos que ele nos pague a conta do restaurante. Mais um paradigma social.
 
E nos surpreendemos quando cada vez mais aumenta o número de amigos, conhecidos e celebridades que decidem jogar tudo para o alto à beira dos quarenta, cinquenta anos. Largam trabalhos estáveis,  longos e insossos casamentos pelo simples resgate da juventude, da esperança, como última chance de fazer o novo de novo, numa tentativa de valorização pessoal.
 
"E disse o Senhor Deus: Não é bom que o homem esteja só; far-lhe-ei uma ajudadora idônea para ele." Gen. 2:18
Se não somos ajudadoras, negamos a nossa origem, o nosso propósito.
 
Verónica Vidal