sexta-feira, 28 de maio de 2010

Penélope Repaginada

É, voltei! E mudei de roupa. Sou mulher, canso da mesma roupa todos os dias, e mudo. Uniforme é bom para economizar nossos modelitos, para não termos que pensar no que vestir no dia seguinte e coisas assim, mas chega uma hora que dá um ódio mortal do repelente tailleur barato e mudamos de emprego só por causa do raio do uniforme. Não precisei chegar a tanto, descobri que haviam outras roupas no armário do blog e resolvi variar. Aproveitei também para dar uma repaginada no visual - neste caso, no meuzinho mesmo. Sei lá, cansei de ser baixinha e gordinha. Como as dietas não funcionam lá muito bem comigo, acho que vou comprar uma cinta e uns sapatos de salto alto.

Essa coisa de gordinha é mesmo uma merda. De um lado, falamos e ouvimos dizer que o que vale é o conteúdo, a cabeça, a personalidade. De outro, estampadas nas revistas só estão as fotos das barrigas chapadinhas, dos biquinis minúsculos. Por que motivo revista de dieta só tem foto de comida? Me dá uma fome! Não tenho mais dedos nas mãos para contar as tantas e tantas vezes em que li uma revista do tipo Dieta Já, Emagreça Imediatamente ou que cacete é, com uma pacote de Negresco no colo, a ser compulsivamente esvaziado.

E sair para comprar roupa então? É o caos! Homens, porque vocês acham que mulher AMA sapatos e bolsas? Porque estes SEMPRE cabem em nós! Poucas coisas no mundo são mais deprimentes do que estarmos num provador de loja, com umas 25 peças de roupa, experimentar todas e nenhuma servir. As que entram em nosso avantajado corpinho nos deixam com aquela aparência de geladeira antiga, quadrada dos lados e arredondada na frente. E logo vem uma FDP de uma magrela a dar conselhos úteis, como: Não precisa deixar de comer, dê uma corridinha... Vaca! Achas tu que os dígitos da balança subiram como? Fazer um gordo correr da sala para a cozinha já é grande feito! Tá certo, eu posso não estar ainda precisando de um guindaste para me arrancar de cima da cama, mas se o fecho dos meus jeans de 1998 não fecham como deveriam, eu tenho todo o direito de esbravejar furiosamente.

Na verdade, na verdade, estamos aqui a tagarelar sobre roupas, mas o pior mesmo é o momento sem roupa: Na hora H, não há strip que se mantenha sensual quando aquele bucho cai no momento de descer a calcinha. É precisamente neste momento que eu odeio de morte os biscoitos Negresco e afins. A Nestlé sabota a minha vida sexual e o meu sonho de filmar um porno doméstico com meu garanhão. Sempre comparei o sexo à comida. Ambos, se não forem praticados com cuidado, engordam. Nos dois casos, se for bom é o céu, se for mau é uma tortura infernal. Na comida podemos usar, mas não abusar, dos temperos. Nem todos combinam entre si. Um casal que só tempera seu bifinho com sal, não deve ir além dos lubrificantes. Já aquele que carrega na pimenta, conhece temperos de nomes exóticos e tem folhinhas de sálvia por cima do prato, pode perfeitamente gastar seu salariozinho na sex shop da esquina e ficará bem servido.

Enfim, babies, acho que a cinta não me vai ajudar nestas horas. Licença, que vou explodir a Nestlé.

Penélope (ainda charmosa, mas rotunda)

terça-feira, 25 de maio de 2010

"E de quimeras mil, um castelo ergui"

E porque temos história. Histórias de contar e histórias de sonhar. Nasci e sonhei que a minha vida de verdade era a vida de mentira que eu inventava. Tão repleta de aventuras, tão cheia de intrigas, tão janeteclaireana!

Da minha primeira infância lembro da jardineira cor-de-rosa com uma laranja bordada no centro do peito, exatamente igual à da minha irmã, que a usava nos mesmos dias que eu. "Parecem gêmeas!" Diziam. E lembro de contar as bolhas que se formavam nas poças d'água, em dia de chuva. Debruçada sobre o parapeito da janela, trepada no braço do sofá de napa grená, ficava eu um sem fim de tempo, a contar: a bolha grande era o pai, a outra a mãe, a menor o filhinho, e, mal contava o filhinho, a bolha-pai já havia estourado. E contava e recontava. Essa cena me veio à cabeça quando lia um post no blog do jacaré molhado. Acho que nasci assim. Inventadeira de histórias. Nunca fiz nada, mas nas minhas histórias já fiz de um tudo. Sou filha do meio.

Ser filha do meio é uma coisa muito mais ou menos. Não somos primogênitas nem somos caçulinhas. Estamos misturadas ao resto da prole que veio vindo. E assim, eu precisava ser especial nalguma coisa. E inventei que era. E virei órfã adotada, virei estrangeira, virei viajada, inventei tanto que acabei por me transformar nalgumas das minhas invenções. Até que descobri que todo mundo inventa, somos todos criaturas criadas pela necessidade do uso das máscaras caiadas que escondem as horrendas cicatrizes dos nossos rostos. E assim vivemos, num carnaval de Veneza, em bailes diários de efêmeras purpurinas, que nos enchem os olhos de brilho e nos cegam o senso. E lipoaspiramos as nossas vergonhas, esticamos o nosso passado, até que ele se torne tão transparente que já não mais nos lembramos dele. E nos cobrimos com mantos Prada, Chanel, apenas o suficiente para mostrarmos as nossas mentiras, o nosso peito de plástico, a nossa cara de Barbie. E essas mentiras já não mais são criticadas, porque já perdemos a capacidade de enxergá-las, tamanho é o desejo de que se tornem verdades. 

E tatuei teu nome no meu coração, marquei minh'alma a ferro com a tua letra, para que, se um dia meu peito se torne de plástico e minha cara se torne de Barbie, minha essência não seja contaminada e tu não me sejas aspirado pela futilidade que então se tornaria a minha vida.

Verónica Vidal