terça-feira, 10 de abril de 2018

Viemos de um mundo que não existe - O mundo da minha avó


Eu costumo dizer que viverei até aos 120 anos. Bem sei que a vida não nos pertence e a qualquer momento ela escapará das nossas mãos mas, por precaução, vamos tomando as nossas medidas para que tenhamos longa vida na terra. Honrar pai e mãe é um dos segredos. Tão bom quanto comer fruta, beber água e fazer exercício.

Hoje minha avó completa 97 anos. Temos celebrado cada ano como uma vitória. Deus tem multiplicado a sua semente de tal forma que já quase não conseguimos contar. Somos tantos e tão fortes, tão diversos e tão iguais, tão jovens e tão maduros, mas uma coisa é sempre comum: Desde bem cedo aprendemos a honrar-nos uns aos outros.

Tenho imenso orgulho da minha família. Não somente pelo número de pessoas que a ela se foi juntando e que fez com que nos tornássemos incontáveis como os grãos de areia, mas também pela integridade de cada um de nós. Somos tantos e somos honrados.

Nos dias nublados que correm, a honestidade é bem precioso a se guardar. Hoje vejo a minha avó sendo cuidada por muitos e lembro dos dias em que era ela quem cuidava de muitos. Vejo a felicidade estampada nos seus olhos quando ela segura ao colo a sua primeira tataraneta. Vejo tudo isso em fotos e vídeos, porque meus pés me levaram para longe mas o meu coração ficou lá junto da minha avó. Vejo o beijo que meu irmão lhe dá e sinto que sou eu a beijá-la. Porque o meu irmão é um pedaço de mim e, portanto,  naquela foto eu também estou. Vejo a barriga da prima que anuncia a chegada de mais um bebé, mais uma semente da vovó. Vejo a vida que se renova, a família estendendo seus braços pelo mundo, o mundo abraçando a minha família. Domingo que vem estaremos todos lá, honrando a minha avó. Uns bons bocados estarão presentes de corpo e alma, outros tantos estarão distantes mas com o coração a comemorar os 97 aninhos da vovó. 

Sempre percebi a casa da minha avó como sendo um mundo, mas hoje entendo que ela transcende o mundo. Mesmo aqueles que já partiram lá estão, nos rostos dos filhos, nos gestos dos netos. Sei que em algum momento uma das tias há de desencavar a caixa das fotos antigas e vovó vai chorar e beijar várias delas. Sei também que, por mais mundo que eu conheça, o meu mundo será sempre a casa da minha avó.

Vó, este será mais um ano em que eu não vou dormir aí. Essa minha vida de estar longe de ti tem ficado cada dia mais chata. Feliz aniversário, vó. Eu sei que tem um montão de gente que te ama muito, mas eu também sei que eu te amo mais. Beijo.

Verónica Vidal - sabe que é adulta, mas ainda morre de ciúmes de todos os outros netos.