segunda-feira, 9 de abril de 2012

O Aniversário Pascal da Minha Avó Alice

Os de ontem, os de hoje e os de amanhã, na varanda, com a minha avó.
Quando eu era menina pequena, a Páscoa era sinônimo de ovos de chocolate embalados em papéis coloridos, coelhinhos de chocolate, almoço na casa da vovó, enfim, festa. Havia uma preparação anterior, uma certa introspecção religiosa que era traduzida na minha infância em dias livres de escola, ir para a casa da minha avó e malhar o Judas ao pé da jaqueira, com o Beto, o tio Vano e o tio Cica, nossos grandes heróis da malhação, os 3 Mosqueteiros do Sábado de Aleluia.

Já muito mais tarde fui aprender o significado da Páscoa, a libertação do povo hebreu da escravidão do antigo Egito, as 10 pragas, Moisés e a posterior celebração cristã, a libertação do homem da escravidão do pecado através do sacrifício de Jesus Cristo. As famílias se reúnem, comem juntas e festejam. 

É bem verdade que já fazíamos exatamente isso, sem entendermos muito bem o significado profundo dos encontros pascais. Reuníamos na casa da vovó toda a família. Comíamos e bebíamos, felizes e livres. Éramos livres por amor. 

Minha avó faz aniversário dois dias depois da Páscoa este ano. A comemoração será na casa da minha madrinha, onde toda a família se reunirá, aproveitando estas duas datas célebres. Os 3 Mosqueteiros de outrora são hoje heróis noutros reinos, as crianças que malhavam o judas geraram filhotes ou voaram para outras estrelas. Mas ainda assim toda a família estará lá reunida na mesma varanda da casa da minha avó, porque a verdade é que aquela varanda também deu filhotes. Eu mesma vi, ninguém me contou. Eu vi a varanda da casa da minha avó na casa da tia Denise, no dia da feijoada. Muita gente já viu. Muita gente notou a mágica. É mágica herdada, não é mágica aprendida. A varanda da casa da minha avó também nasceu na casa da Licinha. Eu não pude ir, só vi nas fotos e ouvi falar. E falei por telefone. Mas o burburinho que se ouvia através daquele telefone era exatamente o mesmo, aquela mágica mistura de vozes, um não-sei-quê que só se entende quando lá se chega, deu-me a certeza da maternidade daquela varanda. Agora, que a varanda da casa da minha avó nasça também aí, na casa nova da minha tia Gisele, no dia da Páscoa, na celebração da liberdade pelo amor, na celebração do aniversário da minha avó Alice, que me ensinou que, mesmo estando longe, eu não posso chorar de tristeza, porque afinal, longe é um lugar que não existe, pois o amor transborda fronteiras e, se Jesus venceu a morte na cruz, quem somos nós para chorar por meros quilômetros? Se uma varanda nascida em Jacarepaguá no Rio de Janeiro, pode magicamente dar filhotes em Salvador, em Maria da Graça e em Pedra de Guaratiba, porque eu não estaria no aniversário pascal da minha avó Alice?

Tendo dito isso e já sabendo que a minha tia Gisele vai me dar um ovo de Páscoa de papel dourado porque, mesmo estando eu já crescida ela no fundo sabe que eu sou criança e me chama de Veônqui, e que minha tia Denise vai botar a criançada toda para dançar lá fora, e a gente bem sabe que é estratégia para não atrapalhar a trabalheira dos adultos, e que os rapazes vão colar no churrasco, minha avó Alice vai olhar para esse delicioso carnaval e terá a certeza de que nenhuma riqueza no mundo pode suplantar a vida e o amor que pulsa nessa família, que pode até ser o retrato da sua, mas que, com toda a certeza, é mágica.

FELIZ ANIVERSÁRIO, VÓ
Feliz é aquele que escolhe ser escravo por amor, que ata seus próprios laços, que constrói suas próprias amarras. Eu escolho estar atada por amor. Eu te amo, Vó.