terça-feira, 25 de maio de 2010

"E de quimeras mil, um castelo ergui"

E porque temos história. Histórias de contar e histórias de sonhar. Nasci e sonhei que a minha vida de verdade era a vida de mentira que eu inventava. Tão repleta de aventuras, tão cheia de intrigas, tão janeteclaireana!

Da minha primeira infância lembro da jardineira cor-de-rosa com uma laranja bordada no centro do peito, exatamente igual à da minha irmã, que a usava nos mesmos dias que eu. "Parecem gêmeas!" Diziam. E lembro de contar as bolhas que se formavam nas poças d'água, em dia de chuva. Debruçada sobre o parapeito da janela, trepada no braço do sofá de napa grená, ficava eu um sem fim de tempo, a contar: a bolha grande era o pai, a outra a mãe, a menor o filhinho, e, mal contava o filhinho, a bolha-pai já havia estourado. E contava e recontava. Essa cena me veio à cabeça quando lia um post no blog do jacaré molhado. Acho que nasci assim. Inventadeira de histórias. Nunca fiz nada, mas nas minhas histórias já fiz de um tudo. Sou filha do meio.

Ser filha do meio é uma coisa muito mais ou menos. Não somos primogênitas nem somos caçulinhas. Estamos misturadas ao resto da prole que veio vindo. E assim, eu precisava ser especial nalguma coisa. E inventei que era. E virei órfã adotada, virei estrangeira, virei viajada, inventei tanto que acabei por me transformar nalgumas das minhas invenções. Até que descobri que todo mundo inventa, somos todos criaturas criadas pela necessidade do uso das máscaras caiadas que escondem as horrendas cicatrizes dos nossos rostos. E assim vivemos, num carnaval de Veneza, em bailes diários de efêmeras purpurinas, que nos enchem os olhos de brilho e nos cegam o senso. E lipoaspiramos as nossas vergonhas, esticamos o nosso passado, até que ele se torne tão transparente que já não mais nos lembramos dele. E nos cobrimos com mantos Prada, Chanel, apenas o suficiente para mostrarmos as nossas mentiras, o nosso peito de plástico, a nossa cara de Barbie. E essas mentiras já não mais são criticadas, porque já perdemos a capacidade de enxergá-las, tamanho é o desejo de que se tornem verdades. 

E tatuei teu nome no meu coração, marquei minh'alma a ferro com a tua letra, para que, se um dia meu peito se torne de plástico e minha cara se torne de Barbie, minha essência não seja contaminada e tu não me sejas aspirado pela futilidade que então se tornaria a minha vida.

Verónica Vidal

8 comentários:

  1. Então temos cá uma menina a se refazer em si mesma...
    Bjinhos...
    Ah! Em tempo: vc é minha fã, não vale! (rsrs)

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  2. Aaaaalli.... Posso te chamar de Alli? É que já andamos tão íntimos! Sou mesmo, tua fã. Leio teus posts e fico suspirando feito menina pequena: ahhh!

    Beijos!

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  3. Menina, tb sou filha do meio!
    Qdo alguém perguntava: vc é a mais velha? Não! Então é a mais nova? Tb não... sou a do meio... meio mais ou menos... hahaha
    Mas eu sou a única mulher, o q já é um diferencial... se bem que eu queria mto ter tido uma irmã...
    Bjins

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  4. É, ter irmãs é bom. Confesso que hoje já não me importo em ser a "do meio", pois a-do-ro dar parabéns à minha irmã mais velha quando ela faz aniversário. Digo: Parabéns à minha irmã "mais ve-lhaaaa!" E assim me vingo. Ehehehe... sou má! Bjim!

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  5. Pronto, deixei de ser anónimo. Pronto, deixei de brincar com o teu decote. Pronto, agora vai sempre ser a sério. Não sei como vim aqui parar, mas só sairei obrigado. Prontooo!

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  6. Bem vindo, meu querido recém revelado Manoel Bastos! Confesso que eu, curiosa que sou, já fui lá remexer no seu blog e ler - de dicionário ao lado - seu Cacimbo. Ando tão culta, depois que aportei em Coimbra! Já agora: a sério: Comigo não precisa ser tão sério. Sou, seriamente, uma pessoa fora do sério! Beijim.

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  7. Juro que nao sei como vim aqui parar... nao sou um "blamer" que segundo o meu dicionário é um falso visitante que tenta atrair atençoes para as suas coisas... virei aqui de vez em quando à procura do que me fez parar (não, não foi isso que me fez parar!)e não para atrair visitantes.

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  8. Ah, bom moço, mas eu gosto de visitar tanto quanto gosto de ser visitada. Meus amigos Jacaré e Tê são boas leituras que viraram leitores - ou ao contrário, já nem me lembro bem. Então, sinto muito grande guerreiro. Agora, que sei sua morada, ofereça-me um café. Prometo só entrar no seu blog de burca. Beijoca.

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Vá, coragem, diga alguma coisa, comente, não dói nadinha... Beijos!