E minha mãe, com poderes especiais, tinha sempre um lanchinho pronto à hora certa. Cinco da tarde era hora de lancharmos, e lá estava o pão, ou o bolo, ou os biscoitos retirados de uma enorme lata de alumínio que morava em cima do armário – bem longe das nossas mãos, pois senão o cardápio diário seria biscoitos do café da manhã ao jantar.
Não havia aniversário sem festinha. E festinha de aniversário para a minha mãe, tinha que ser especial. Com lembrancinhas feitas de isopor, confeccionadas em casa, docinhos e salgadinhos, nenhum encomendado. Nossa casa se transformava numa verdadeira fábrica de fazer festas, meses antes, quando os enfeitinhos eram então preparados. Vovó ia invariavelmente lá para casa, no dia da festa bem cedinho, e fazíamos cajuzinhos. Mamãe confeitava o bolo, com o saco de confeitar e seu inseparável bico pitanga. Cada festinha tinha um tema diferente, um personagem diferente e não se poderia repetir. Com 3 filhas, eram 3 festas de aniversário por ano. Tivemos Chapeuzinho Vermelho, Moinho Holandês, Festa Junina, Branca de Neve, e um sem fim de personagens que desfilavam pela casa depois das festas e se iam estragando aos poucos, à medida das nossas brincadeiras e fantasias. Alguns, eram delicadamente guardados numa sacola grande, como lembrança última, feito um tesouro, e, vez por outra, nos era permitido fuçar o saco das lembranças, que ficava a salvo das nossas mãos destruidoras, em cima do guarda-roupa.
O tempo passou e das festinhas restaram algumas fotos. Minha mãe ainda fez algumas festinhas coloridas para minhas filhas, mas eu não herdei dela os poderes especiais de conciliar tanta coisa e tudo sair perfeito. Já vivia então na época do “comprar pronto”, dos kits festinha e depois do festinha nenhuma, da celebração num restaurante, enfim, cortei muito da magia dos aniversários das minhas filhas. Mamãe se foi e com ela levou sua fantástica fábrica de festinhas. Definitivamente não tenho poderes especiais. Não conseguia manter a casa impecavelmente limpa e as latas de mantimento semanalmente areadas com Bombril, na minha casa nunca brilhariam. Não sei fazer a pizza de sardinha de massa alta aos sábados, nem o pão-de-ló molhado com calda de abacaxi. Nunca aprendi a confeitar um bolo e nem tenho bico pitanga. Minhas plantas morrem. Todas. Eu tive uma mãe super-poderosa. Talvez a kriptonita da minha vida tenha enfraquecido os meus poderes, ou nunca os tive mesmo. Desculpe, filhas.