sábado, 11 de abril de 2020

O Amor em Tempos de Covid

10 de Abril de 2020. É Sexta-feira Santa.
A maior parte do mundo está de quarentena, encerrada em casa. A humanidade está enferma.
Muitos choram e lamentam os seus mortos. Outros bravos nascem em meio à pandemia que se instalou. Mas para a minha família há um motivo especial de celebração: É o aniversário da minha avó Alice.

E foi assim que celebramos os 99 anos da minha avó: Cada um da sua casa, tateando uma tecnologia que ainda é nova para muitos mas que nos fez ficar juntos por deliciosos minutos. E lá fomos nós, superando as dificuldades de vídeo, de áudio, juntarmo-nos para cantar os parabéns à avó Alice e revermo-nos um bocadinho. E toda a gente falava ao mesmo tempo, tal e qual a varanda da casa da minha avó. E tantas gerações ali se juntaram, tantas famílias ali reunidas, pura e simplesmente por amor. E minha avó nos via, a todos, e sorria, e demonstrava uma felicidade genuína, simples, de quem está acostumada a ver os anos passarem e as mudanças da vida transformarem tudo, até mesmo as festas de aniversário. E fizemos as fotos mais feias de toda a história dos encontros. Só que mesmo nessa imensa bagunça de rostos misturados e captados numa fealdade hilária e torta, com cabeças cortadas e imagens desfocadas, vê-se uma alegria quase palpável, uma felicidade que grita.

A minha família não tem uma árvore genealógica. É formada por um jardim genealógico, posto que outras árvores entrelaçaram seus ramos na nossa, de tal forma que nos é praticamente impossível definir a origem de todos. Eu tentava explicar à minha filha quem era quem, filho de quem, neto de quem e perdi-me no meio do caminho.

Minha avó atravessa uma estrada pedregosa há 99 anos. Pelo caminho precisou despedir-se de dois maridos, quatro filhos e uma neta. Enfrentou doenças complicadas e cirurgias perigosas. Nunca, nunca deixou-se vencer pelas perdas. E talvez seja por isso que a celebração de cada aniversário dela tenha uma importância agigantada para nós. Muito mais do que um aniversário, celebramos a vida, o amor, a família, as raízes, a aceitação do outro. D. Alice nunca foi mulher de grandes e célebres frases, mas sim de grandes e indeléveis atitudes.  E o bem contagia. Contagiou-nos a todos. Somos uma família do bem, um jardim de amor. A humanidade precisa de mais avós Alice espalhadas por aí. E assim, ela será curada.

Verónica Vidal - tentando levar a vida com a mesma positividade da avó. 

3 comentários:

  1. Tia Alice é uma mulher admirável, uma inspiração! E você, consegue captar o espírito alegre, sincero e amoroso dessa família linda!
    Mais uma vez, AMEI!

    ResponderExcluir
  2. Reler seus contos sempre me trazem um misto de alegria, risos, saudades e lágrimas. Amo muito!!!!

    ResponderExcluir

Vá, coragem, diga alguma coisa, comente, não dói nadinha... Beijos!