quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Mariana Acende o Sol

Mariana. Atriz, 7 anos, lisboeta.

Saltitava por entre os mundos a fim de descobrir como se apaga o Sol, pois sua Rosa logo se tornaria velha com o passar do tempo. E o tempo era impiedoso. Ah, sim, Mariana encenava a peça "Como é que se apaga o Sol?" baseada no livro de Antoine Exupery "O Principezinho" (O Pequeno Príncipe, no Brasil).


Mariana é uma doce menina cheia de energia e que, do alto dos seus 7 anos, consegue nos abraçar com uma risadinha nervosinha. Tagarela e inteligente, é filha única numa casa com pai, mãe, avô, tio, e tia a rodeá-la de carinhos e colinhos e miminhos, além dos muitos e muitos cala-a-boca-Mariana, fica-quieta-Mariana e venha-cá-Mariana. O fato é que ela enfeita a vida daqueles como um quadro à parede nua.

E saímos nós, daqui da aldeia, bem munidos e apetrechados de batatas e cebolas e alhos e bugalhos, para visitar o primo da cidade, a pretexto de assistir a peça de teatro. Levávamos ainda o genro e a filha, com o neto ainda empacotadinho na barriga.e, se não fossem as auto estradas e o carro luxuoso, seríamos a família Buscapé sem tirar nem por.

Uma vez sentada na sala de Teatro da Academia de Santo Amaro, e ver o pai da Mariana a posicionar-se em lugar estratégico para fotografar a arte da cria, era impossível não reviver os momentos das apresentações das minhas filhas no CEJOP. Era impossível não planejar mil e uma coisas para o neto que está para nascer.

E a Raposa diz: "Tu te tornas eternamente responsável por aquele que cativas". Ora, Mariana, sendo assim, és responsável por mim. Acendeste-me o sol.

Verónica Vidal

Para a Mariana, a menina que pode fazer quase todas as coisas do mundo, e até fora do mundo, como acender o Sol, por exemplo.


sexta-feira, 4 de novembro de 2011

E Foi Assim Que Eu Me Apaixonei Pelo Valter Hugo Mãe

Minha mãe tinha uma grande estante na sala e uma coleção de livros do A.J.Cronin. Acho que eram umas 12 encadernações, já não lembro bem, algumas com mais do que um livro. Lembro que muitas vezes era minha tarefa tirar o pó da estante e eu acabei por me interessar em ler alguns dos livros. Eu devia ter uns 10 ou 11 anos e não era leitura exatamente apropriada para a minha idade, mas foi por aí que eu abandonei o Monteiro Lobato e comecei a sonhar com romances. Mamãe era sócia do Círculo dos Livros e sempre tinha um livro novo lá em casa, e assim, passeamos pelos mistérios de Agatha Christie, misturados à coleção Vaga-lume que era obrigatório ler para a escola . Com a chegada da adolescência, devorei tudo o que havia de Sidney Sheldon até perceber que todas as suas heroínas tinham seios redondos e duros e seus homens membros entumescidos. Abandonei-o sem dó nem piedade e senti-me ludibriada, até ler Lolita. Li-o porque havia um filme qualquer e alguém me tinha dito que era proibido. É de Vladimir Nabokov, um sujeito russo que escrevia diferente dos outros. Escrevia na primeira pessoa. Escrevia coisas de pessoas de verdade, pessoas que não eram incrivelmente belas nem tinham iates nem nada. Aliás, nem preciso falar de Lolita, muita gente já disse tudo, mas na época eu não sabia nada. Comecei então a desenhar os meus gostos e preferências por livros, apesar de ainda ler - como ainda hoje, até rótulos e bulas de remédio.

Numa bela manhã de sol, eu abri "Cem Anos de Solidão". Talvez não fosse manhã e talvez não estivesse fazendo sol, mas achei que ia ficar bonito colocar assim. Li "Cem Anos de Solidão" e morei na Macondo durante todo o tempo em que estive agarrada ao livro. E assim apaixonei-me irremediavelmente por Gabriel Garcia Marquez, enquanto muitas mulheres tietavam Wando e Roberto Carlos, eu amava secretamente o meu Garcia. Li muita coisa que ele publicou, não vale a pena estar aqui a fazer listinhas, mas é fato que eu o amava. Talvez ainda o ame. Fantasiei que Isabel Allende o roubaria de mim, porque eu também gostava dela e, se eu gostava dela, ele poderia gostar também e casar-se com ela em grandes festas. Amar escritores não tem uma lógica, pois eles não têm rostos e muitas vezes nem estão mais vivos. Mas amamos na mesma, do mesmo jeito que se ama o Justin Bieber. Pois é, cada um com a sua doidice.

Não vejo novelas. Não que eu não goste, mas tenho dificuldade em acompanhá-las, então, perco a história. Não me interesso muito por televisão, portanto, meu tempo livre é para ler. O livro é como o meu game boy: levo-o para a fila do banco e para tudo que é tipo de espera. É prático e não requer pilhas. Nos últimos tempos, só tem sido preciso um acessório: óculos.

Vi na net uma entrevista com um escritor português que havia ido à FLIP (Festa Literária Internacional de Paraty). A chamada era qualquer coisa como: "Escritor português conquista o Brasil". Cliquei, vi a entrevista, achei de uma doçura sem tamanho. Uns dias mais tarde uma amiga comentou sobre ele e mais uns dias perguntei na livraria sobre seu último livro. Li. Terminei hoje. Apaixonei-me por ele. Nunca pensei que, depois de tantos Kafka, Eça, Jorge Amado, Saramago... ninguém me havia roubado o coração como o Gabriel Garcia Marquez. E o Valter Hugo Mãe o fez. Li "O filho de mil homens". E é tão doce e tão suave, que dá vontade de levá-lo ao colo e beijá-lo. E eu chorei como o homem maricas do livro. Porque ele falava coisas de gente grande com um jeito tão doce, quase infantil até, que nos faz pensar, porque não somos todos assim? É, eu também acho que muita gente adoece de doenças graves por falta de leitura. 

Verónica Vidal

Ao Valter Hugo Mãe, que não me conhece nem nunca ouviu falar em mim, mas que me fez chorar e rir e chorar e rir. Por favor, não case com a Isabel Allende.